domingo, 6 de fevereiro de 2011 | By: Doracino Naves

Lobo em Noite Escura

Minha inspiração para escrever chega quando finco raízes em Porto dos Barreiros de onde vem o cheiro da terra molhada pelas águas do Rio Paranaíba. Sinto o reflexo do sol nas matas de flores pequeninas igual a um tapete multicolorido guardado na memória da infância. Jamais vou esquecer o lugar onde respirei o primeiro ar e senti nos olhos o primeiro lampejo de luz. Nessa  despretensiosa crônica para o DM o cenário do pequeno vilarejo, com duas ruas de terra batida e poucas casas, surge para cutucar a minha imaginação. Porto dos Barreiros, onde nasci; base de viagens pelos escondidos caminhos da alma. De lá é que lanço naves tripuladas com sonhos, rumo ao infinito. Danço igual lobo na noite escura à procura do amor.

Goiânia, Palmelo, Rialma, Vila Nova e o Bairro Popular são os meus novos amores. Mas a paixão original é por Porto dos Barreiros. Para mim a Vila Nova e o Bairro Popular são independentes de Goiânia. Talvez por ter vivido na Vila Nova a minha adolescência e, no Bairro Popular, a alegria de criar meus filhos.

Outro dia meu irmão Sinésio puxou a minha orelha.

- Seus amigos da Vila Nova estão chateados. Você escreve mais sobre o Bairro Popular do que a Vila Nova. O Caburé mandou lhe dizer que você é da Vila Nova e não do Bairro Popular.

Pois sou assim. Descubro-me volúvel por esse amor ecumênico. Sem culpas perdôo-me pela confessa infidelidade. Minha sorte é que, mesmo telúrico, carrego uma pequena estilha da universalidade de Deus em meus amores.

Então, viva Goiânia, Palmelo, Rialma, Vila Nova, Bairro Popular. Mas, Deus, guarde Porto dos Barreiros, minha Atlântida perdida nas águas do Rio Paranaíba, onde recebi a luz da iniciação terrena. Aprendí com o povo simples de Porto dos Barreiros a amar, amar e amar o próximo como fosse o último dia da existência.
Mas, às vezes pairam sobre nós nuvens negras anunciando tempestades.

Pois é, irmãos. O homem prefere lamber as grades da sua imaginária cadeia do que conhecer novos mundos:  não descobiu que é só abrir a porta e sair. Por outro lado, talvez, a liberdade plena é nunca  desejar vencer na vida. Porque vencer sinaliza que devemos passar o outro para trás, deixá-lo na poeira com seus medos na noite de densa escuridão, tal qual lobo na espreita da presa.

Zequinha, sábio personagem de Porto dos Barreiros ganha força nas minhas lembranças. Depois de muitos anos encontro-o com a ideia nas alturas.

- Cheguei a um ponto da vida em que revogo qualquer competição. Seja nos negócios, com os amigos, irmãos, mesmo com a minha mulher que quer competir comigo. Eu não desejo vencer na vida! Quem quiser passar na minha faça-o sabendo que não trapaceio para ganhar corrida. Quem vive o clima dessas disputas é um idiota. No fim da vida podemos perguntar: “quem ganhou a corrida?

Meus cabelos balançam com o vento que sopra do lado das Minas Gerais; ainda molhados com a espuma branca do grande rio. Grisalhos, tem raízes plantadas com o tímido sol de janeiro e as flores que brotam no cerrado do lobo guará.

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