sábado, 28 de maio de 2011 | By: Doracino Naves

Sacola eletrônica

Ainda não resolvi o meu preconceito contra o sertanejo universitário e o axé. Sou o avesso desse modismo musical que fustiga os meus ouvidos. Ainda bem que em  Goiás não se vive só a música sertaneja. Noutro dia recebi de presente do compositor Carlos Brandão um CD Instrumental com as músicas dos Beatles; caricia nos meus ouvidos cansados das vozes lamurientas do mundo. No meu porta CD tem André Rieu, Eles por Elas – coleção de MPB feita por compositores da terra – nas vozes de Maria Eugênia, Débora de Sá, Taís Guerino, Larissa Moura, Fé Menina e Bel Maia. Guardados num cantinho especial ainda tem: Chico Buarque, Tom Jobim, Dorival Caymmi, Vinícius de Moraes e Frank Sinatra.
                                
Na sacola eletrônica - Pen-Drive - guardo uma seleção de músicas clássicas, outra de evangélica – para aliviar o meu espírito inquieto – e uma série de músicas caipiras indicadas pelo amigo Álvaro Catelan. Pois é, eu gosto de música sertaneja antiga até o advento Milionário e José Rico. Depois disso a música sertaneja piorou muito. Na madrugada que vai até as seis horas sintonizo a RBC FM ou a rádio AM 730 no programa Raiz Brasileira. Vou ouvindo até começar um sertanejo universitário. Quando isso acontece mudo de estação ou volto para um dos CD’s comprado no Bazar Paulistinha.
                           
Balanço entre dois extremos musicais: do rock ao gospel. Faço biscates pelas músicas que me agradam. Cresci ouvindo a MPB na televisão e nos barzinhos de Goiânia. Naquela época só se ouvia música caipira no rádio; na TV, o programa Viola minha Viola, da excelente Inezita Barroso e, em Goiás, no Frutos da Terra, com o mestre Hamilton Carneiro.  Hoje o sertanejo universitário predomina na televisão e nos bares da cidade. Invejo quem mora em Pirenópolis e Alto Paraíso, que ouve, nos bares e restaurantes,  só Bossa Nova e MPB. Lá a música sertaneja não tem vez. Tenho um amigo que diz que gente igual a mim deve ser doente da cabeça ou dos pés.
                           
Talvez eu seja dos dois. Confesso que sou mal resolvido nos meus preconceitos; não danço conforme a música. Ouvir Ivete Sangalo com caras e bocas é um martírio. Estou ficando velho e preconceituoso.  Aliás, neste contexto, vou descarregar aqui a minha prevenção contra gente igual à Xuxa, Luiza Thomé, Fernanda Torres e, para não dizer que só falei das flores, ou seja, das mulheres, trago para essa conversa o ator Alexandre Borges que interpretou o “florzô” Jacques Leclair na última versão de Ti-Ti-Ti. Uma interpretação grotesca que desmerece Reginaldo Farias, o primeiro intérprete dessa personagem. Volto ao sertanejo.
                         
Não sou hipócrita para dizer que a música sertaneja é o nosso cartão de visita.  Porque não é. E, digo mais, não retrata todos os gostos da nossa gente. Para falar a linguagem goiana - temos várias tribos na música: o sertanejo, o rock - Goiânia é  referência mundial com os festivais do porte do Bananada, Vaca Amarela e o Goiânia Noise. A MPB feita por aqui também é ótima. Por último, a música clássica, cuja estrela maior foi  Belkis Spenciéri, que tem seguidores fiéis.
                         
Quem gosta do sertanejo universitário inventa para si mesmo uma grandeza musical que não existe nos acordes de Luan Santana, Bruno e Marrone e outros gritantes. Mas, não me atrevo a aprofundar essa ideia, nem quero polemizar. Porque de música nada entendo. Mas, não ouço e não gosto do sertanejo universitário e do axé.
                         
Pronto! Estamos conversados. Por essa causa, julgo-me preconceituoso num mundo em que a maioria deseja ser feliz que nem a Cinderela. 
                        
Mas, suplico, não me leve a sério. Esse preconceito só aumenta o volume da minha sacola de pecados. E isso não é bom para nenhum cristão. Meu avô Cláudio, caipira das Minas Gerais, se ainda estivesse vivo, talvez dissesse, ajeitando o seu chapéu: Uai, filho, isso não se faz!
                         

Doracino Naves é jornalista. Diretor e apresentador do programa Raízes Jornalismo Cultural, na Fonte TV. (www.raizestv.net). Escreve aos sábados neste espaço.