segunda-feira, 6 de janeiro de 2014 | By: Doracino Naves

Solstício de verão


      (Inspirado num conto do romancista francês André Mourais)

No sábado passado, dia 21, aconteceu, no hemisfério sul, o solstício de verão.  Começou a nova estação e o novo ano vem logo.  Enquanto isso no céu, sob a luz do oriente, se abre o santuário do Tabernáculo.

Dois iniciados dirigem seus potentes olhares para a terra. O primeiro é o Mestre, humilde e paciente a ensinar, e o outro, Aprendiz, ainda neófito, quer saber como é a vida na terra. O Mestre com voz pausada e simples começa o período de instruções.

Mestre
Aquele planeta, luminoso com a cor celeste, é a terra. Olhe mais ao sul, na orla banhada pelo mar azul. Aquele é o Brasil, que acaba de atravessar o solstício de verão e começa, para eles, um ano novo. Com mais atenção verá seus habitantes apressados a correr pelas ruas em busca de presentes mútuos. No final da correria celebram em festas noturnas com muita bebida.

Aprendiz
Fantástico, Venerável Mestre! Tudo está muito agitado. Homens e mulheres estão festivos; carregam pacotes cobertos com papéis coloridos. Vejo luzes piscando sem parar nas calçadas e fachadas das casas. Veja aquela mãe colocando presentes na árvore montada na sala! Que lindo de se ver: até os mais pobres gastam seu pouco dinheiro em presentes mais simples. Jamais poderia imaginar tanto amor em criaturas tão atrasadas.

Mestre
Além da sua condição miserável de se arrastar pela terra é uma raça corajosa. Ali está um exemplo: parte daquele estádio de futebol desabou matando dois operários. Sem desanimar, essas criaturas passageiras recomeçam seus pequenos esforços. Assim eles também se juntam nas grandes catástrofes.

Aprendiz
Pois é, Mestre. Nas primeiras lições o senhor me mostrou os terráqueos se destruindo nas guerras. Foi horroroso saber que, primeiro pelo fio da espada, depois, com tiros e bombas, cortaram cabeças e despedaçaram os corpos de seus semelhantes. Noutras vezes gases mortíferos asfixiaram multidões. É difícil compreender a fúria desses animais. Se hoje eles revelam bondade é porque repararam seus erros?

Mestre
Observe melhor e tire suas conclusões.

Aprendiz
Ainda há muito que fazer. As famílias estão sendo arrasadas pelo egoísmo das drogas. Por toda parte há navios nos portos, insetos disputam comida com os humanos. Por todo lado existem milhares de enfermos e famintos. Veja ali, Mestre, restos de comida no lixo. Nesse mesmo lugar onde há homens com fome, outros deixam o alimento apodrecer.

Mestre
Observou bem. É o mais louco dos planetas. Você o vê agora e se espanta com a desigualdade do Brasil. Da mesma forma que o vê hoje eu o conheço a terra a milhares de anos no curso da sua história. Após cada período de convulsão sucede outro de equilíbrio. Depois tudo recomeça. A sorte é que espíritos evoluídos chegam lá com a missão de paz, prosperidade e evolução. Pouco a pouco se tornam senhores do planeta.

Aprendiz
Donos de uma gota de lama, de onde os terráqueos são feitos.

Mestre
Para eles é o mundo. Mas Deus olha para eles com indulgência. Assim progrediram na ciência e nas artes. Breve entrarão um meio de evoluir no ócio criativo.

Aprendiz
Será que eles compreendem o seu papel nessa vida?

Mestre
O velho mestre abre um espaço por onde passam vozes de todos os lugares do universo. Vozes e ruídos chegam aos seus ouvidos. Os vigilantes, diáconos e obreiros do Tabernáculo estão atentos. O Capelão reproduz as vozes vindas do Brasil: Crise nos poderes – Desastres ambientais- Feliz Natal – Próspero Ano Novo – Drogas, corrupção – Estou perdido – Feliz Natal – Próspero Ano Novo – Violência nas ruas – Inflação - Feliz Natal – Próspero Ano Novo.

Aprendiz
Que confusão! Por que se misturam votos de festas e lamentações?

Mestre
Esse país, atualmente envolto no desencanto é o cenário de um tempo de prosperidade e o seu povo, a despeito das mazelas, será feliz. Logo seus campos estarão cobertos de relva e as flores do tempo de paz social haverá de inspirar seu povo rumo à plenitude do espírito. A ordem nasce da desordem. Assim caminha o Brasil.

Aprendiz
País estranho e cruel.

Mestre
Mas, é um dos mais belos da terra.

Doracino Naves, jornalista; diretor e apresentador do programa Raízes Jornalismo Cultural (WWW.raízestv.net). Escreve aos sábados no DMRevista.

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