segunda-feira, 1 de abril de 2013 | By: Doracino Naves

Avental branco


O príncipe Tamino, na escuridão de uma imaginária e densa floresta, clama desesperado por Luz. O seu grito de socorro ecoa forte: Socorro!, Socorro!, Socorro!. Assim começa a ópera A Flauta Mágica, composta magistralmente por Mozart. O cenário imaginado pelo autor talvez fosse a Floresta Negra, da Alemanha iluminista do século dezoito. No roteiro da ópera o sol surge devagar até iluminar completamente o palco.
               
Um majestoso coral canta solene: A glória do sol dourado conquistou a noite. O falso mundo das trevas conhece agora o poder da Luz. Depois vem a estrofe final: A beleza e a sabedoria haverão de iluminá-los com o sol. O iluminador do teatro joga do fundo do palco para plateia uma potente luz que cega a todos.  Depois dessa reação a luz se projeta para o alto com claro sentido simbólico. Percebe-se, na expressão de Pamino, o desejo de se religar ao céu.
            
Mozart descreve, nessa obra, a perambulação de um iniciado pelo caótico mundo material. Começa nesse ponto a fantástica viagem ao trono do espírito; morada eterna da honra e da virtude que se sobrepõem aos efêmeros valores da matéria. Essa peça de conotação iniciática é a alegoria da busca incessante pela Verdadeira Luz. E essa Luz, assim como o avental branco com pele de cordeiro, alude a Cristo.
              
O avental branco é oferecido ao iniciado como prova de estima e consideração por ter enfrentado e vencido a Rainha da Noite. Há, no meu entendimento da famosa ópera, íntima ligação entre a brilhante Luz, Cristo, e o avental branco simbolizando a pureza, a inocência e a paz. A cor branca, por reunir todas as cores, denota o sentido fraternal do amor cristão entre os homens.  Também simboliza santidade e reverência. Mozart revelou em sua obra transcendental, a intenção de ligar o seu espírito ao alto.  Posso perceber a insubstituível inspiração divina em toda criação artística.
              
É um presente aos olhos enxergar o campo de trigo branquejar para a ceifa; imagino, pela narração bíblica, a figura de Cristo, no monte, transfigurado em suas vestes resplandecentes e brancas.  O apóstolo Marcos, comprovando a eterna deidade de Cristo, conta nesse versículo a narrativa de Pedro, Tiago e João: Brancas como nenhum lavadeiro as poderiam alvejar.
                   
Interpreto o valor simbólico do Avental Branco mais antigo e prestigioso do que o Tosão de Ouro ou a Águia Romana. Mesmo a Ordem da Jarreteira, honrada e digna, não se aproxima da glória e da beleza do Avental Branco, ‘símbolo da inocência e o laço da amizade’. O princípio cristão assevera que Cristo nos honra sempre. É fundamental para chegar à sua gloriosa presença Lhe devotar toda honra. Então, se nunca O desonrarmos Ele nunca nos desonrará. Eu creio que tudo isso é verdade como vejo a lua prateada surgindo por trás da mata. Viajo em busca da Luz, tocando a minha flauta mágica para vencer os perigos escondidos na floresta. 

(Publicado no jornal Diário da Manhã - DMRevista - Goiânia - Goiás em 30 de março de 2013)

Doracino Naves, jornalista; diretor e apresentador do programa Raízes Jornalismo Cultura, na Fonte TV (www.raizestv.net). Escreve aos sábados no DMRevista

0 comentários:

Postar um comentário