terça-feira, 5 de março de 2013 | By: Doracino Naves

Tosão de Ouro

Atravessar o mar Egeu sem destino em busca do Velo de Ouro fez Hércules parar os seus doze trabalhos e se juntar a Jasão e aos argonautas.  A lenda dos argonautas narra que o Velocino de Ouro foi feito por Frixo com a lã dourada do fulgurante carneiro que era inteligente e voava como um pássaro.  Exausto pela viagem vertiginosa sobre terras e mares na fuga para longe da Grécia, deu seu último suspiro no alto dos picos do Cáucaso, entre a Europa e a Ásia. Seu espírito subiu às estrelas formando o Carneiro do Zodíaco; a sua lã de ouro ficou aqui embaixo. A cobiça pelo talismã, segunda a crença, liberava riqueza e poder a quem o possuísse. Isso levou os seus donos a pendurá-lo num carvalho sob a guarda de um dragão que nunca dormia. Jasão foi encarregado a roubar o Velo de Ouro com a ajuda dos argonautas.
                     
Os alquimistas acreditam que essa lenda inspirou Felipe III, duque de Borgonha, a criar o Tosão de Ouro. Na prática Tosão de Ouro é uma Ordem de Cavalaria fundada para a defesa do reino e da fé cristã.  Para confirmar essa versão teísta, que julgo verdadeira, durante o ato de criação da Ordem de Cavalaria Tosão de Ouro passeou entre os convidados um carneiro vivo pintado de azul, emblema do Agnus Dei que tallis peccata mundi  - Cordeiro de Deus que tirais o pecado do mundo – que é Cristo. Hoje o Tosão de Ouro é exclusivamente honorífico.
                      
Sendo assim, O Tosão de Ouro representa uma alegoria do Velho Testamento na qual aparece Gideão sendo preparado para a vitória sobre os vizinhos ambiciosos. Ele foi um homem valente, mas, durante um tempo se escondeu diante do domínio dos midianitas, beduínos primitivos do deserto da síria que saqueavam a agricultura e o rebanho dos hebreus. Gideão, preparando-se para a batalha, pede um sinal a Deus, na lã, com ou sem orvalho, no sentido de fortalecer a sua fé e provar a sua liderança. Deus primeiro responde com a lã encharcada. No outro dia a lã estava seca, porém, cercada de orvalho. A água transformou a lã do cordeiro no ouro da promessa.
                        
O Tosão de Ouro foi uma ordem cavalheiresca formada por líderes em defesa do bem. Quem lidera deve se renovar constantemente. Gideão foi um exemplo de mudança interior com muita fé. Tentando adivinhar o que ia ao seu coração, talvez ele dissesse: eu sou um homem nascido que procura nascer de novo. Quero me transformar. Assim, do orvalho da manhã renasce a vida cheia da força do eterno retorno. O dia seguinte surge com o dourado alvorecer.
                       
Considero o Tosão de Ouro uma boa imagem da superação. Seja na versão alquimista ou na concepção teísta a vida é pavimentada com pedras irregulares. Nossos pés, cascos de cavalos cegos, caminha sob caminhos  encorcovados onde o futuro é denso e escuro. Talvez daí venha o medo. Jasão ou Gideão tiveram medo, mas venceram-no.

                              Doracino Naves, jornalista; diretor e apresentador do programa Raízes Jornalismo Cultural, na Fonte TV(www.raizestev.met). Escreve aos sábados no DMRevista. 

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