Senador Canedo era só uma estação de trem; fim da linha de quem vinha de Araguari; começo de viagem para quem saía de Goiânia. Só havia a estação e singelas casas compunham o cenário de uma pequena comunidade do interior. Num final da tarde o sol, já cansado do dia, não alumiava de cima; era de lado que a luz chegava mostrando sombras. Longe, um tropel anunciava a chegada de um burro carregado de lenha; arauto de tragédia.
De cada lado um feixe amarrado equilibrava o outro; tinha um facão enfiado entre a lenha. Um homem estranho com passos lentos puxava a rédea. Suas roupas grossas feitas de algodão cru. Um chapéu de palha marrom cobria a cabeça grande. Na cara um bigode espesso. Do lado direito da boca um mascado cigarro de palha. Seu olhar, rasteiro, tinha sobrancelhas grossas e a testa franzida era o de um homem com cara de mau. O burro alazão parecia mais com gente do que aquele homem. Ia para o lado do único armazém do lugar.
As portas da venda do Zé eram feitas de ipê. Toscamente trabalhadas por um formão impreciso; marcas bêbadas em desalinho. Duas bandas da porta davam para a rua principal, outra mostrava a saída para uma rua lateral onde morava um cachorro bernento; os vermes já tinham comido uma parte do seu lombo podre. De dentro da venda vinha um cheiro forte de fumo, cachaça e querosene. Num canto escuro, rolos de corda de bacalhau usados na lida do campo.
O homem estranho entrou, pediu uma pinga e um pedaço de fumo de Bela Vista. Mordeu um pedaço do fumo e o mascou fazendo careta como o diabo na presença de Deus. Jogou a pinga na goela, seu corpo arrepiou; náusea de ruindade. Cuspiu no meio da rua pedaços de fumo e cachaça. Com uma binga acendeu de novo o cigarro de palha que se apagara por falta de pitar. Deu duas baforadas e mirou a rua deserta. Uma lagartixa verde cruzou com a cabeça em sentinela.
Com o sol se aninhando por trás do morro Zé da Venda acendeu uma lamparina a querosene. Dentro do armazém escureceu mais rápido. Com um olho fazia contas; o outro observava o freguês incômodo. Viu quando sua botina rangedeira trouxe o fantasma para perto do balcão grosso de madeira.
- Quero uma lata de querosene, um rolo de fumo, duas braças de corda e uma garrafa de pinga em troca da lenha!
Seu Zé tremeu de medo. Era muito pela lenha. E nem era boa de fogo.
-Não preciso de lenha. Pode ir embora que não vou lhe cobrar o que já lhe servi.
O estranho, sorrateiro, foi até o burro pegar um facão. Quando enfiou a mão na lenha uma enorme cascavel saiu pendurada com as presas cravadas na mão direita do intruso. Um grito de horror:
De cada lado um feixe amarrado equilibrava o outro; tinha um facão enfiado entre a lenha. Um homem estranho com passos lentos puxava a rédea. Suas roupas grossas feitas de algodão cru. Um chapéu de palha marrom cobria a cabeça grande. Na cara um bigode espesso. Do lado direito da boca um mascado cigarro de palha. Seu olhar, rasteiro, tinha sobrancelhas grossas e a testa franzida era o de um homem com cara de mau. O burro alazão parecia mais com gente do que aquele homem. Ia para o lado do único armazém do lugar.
As portas da venda do Zé eram feitas de ipê. Toscamente trabalhadas por um formão impreciso; marcas bêbadas em desalinho. Duas bandas da porta davam para a rua principal, outra mostrava a saída para uma rua lateral onde morava um cachorro bernento; os vermes já tinham comido uma parte do seu lombo podre. De dentro da venda vinha um cheiro forte de fumo, cachaça e querosene. Num canto escuro, rolos de corda de bacalhau usados na lida do campo.
O homem estranho entrou, pediu uma pinga e um pedaço de fumo de Bela Vista. Mordeu um pedaço do fumo e o mascou fazendo careta como o diabo na presença de Deus. Jogou a pinga na goela, seu corpo arrepiou; náusea de ruindade. Cuspiu no meio da rua pedaços de fumo e cachaça. Com uma binga acendeu de novo o cigarro de palha que se apagara por falta de pitar. Deu duas baforadas e mirou a rua deserta. Uma lagartixa verde cruzou com a cabeça em sentinela.
Com o sol se aninhando por trás do morro Zé da Venda acendeu uma lamparina a querosene. Dentro do armazém escureceu mais rápido. Com um olho fazia contas; o outro observava o freguês incômodo. Viu quando sua botina rangedeira trouxe o fantasma para perto do balcão grosso de madeira.
- Quero uma lata de querosene, um rolo de fumo, duas braças de corda e uma garrafa de pinga em troca da lenha!
Seu Zé tremeu de medo. Era muito pela lenha. E nem era boa de fogo.
-Não preciso de lenha. Pode ir embora que não vou lhe cobrar o que já lhe servi.
O estranho, sorrateiro, foi até o burro pegar um facão. Quando enfiou a mão na lenha uma enorme cascavel saiu pendurada com as presas cravadas na mão direita do intruso. Um grito de horror:
-Cobra desgraçada!
Deu alguns passos e caiu de bruços. Suas narinas ofegantes do último suspiro sopraram a poeira da rua. Uma lagartixa correu pro mato. Seu Zé, sem pressa, enrolou um cigarro; com a lamparina perto dos olhos acendeu seu cigarro de palha. Outras quatro lamparinas foram acesas para velar o valentão que encontrou em Senador Canedo o fim da linha e o começo de outra viagem.
Doracino Naves é jornalista, diretor-apresentador do programa Raízes Jornalismo Cultural, na Fonte TV (www. fontetv.net)
Doracino Naves é jornalista, diretor-apresentador do programa Raízes Jornalismo Cultural, na Fonte TV (www. fontetv.net)
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